domingo, 29 de maio de 2011

Marcha pela Liberdade e a censura prévia em São Paulo



Do Blog do Sakamoto:

Sempre gostei do poema do dramaturgo alemão Bertolt Brecht que tratava da indiferença. Andaram pela mesma linha Maiakovski e Niemöller, escrevendo sobre o não fazer nada diante da injustiça para com o outro, até que, enfim, o observador passivo se torna a vítima. Situação mais atual do que nunca, em um dia em que a Justiça do Estado de São Paulo decide impor censura prévia a uma manifestação pelo receio de que, talvez-sei lá-quem sabe-pode ser, venha a ocorrer apologia às drogas. Do alto de seu pedestal, de onde avistam de longe a sociedade, os excelentíssimos não perceberam que a discussão não é mais apenas sobre a maconha e sim sobre o direito de não apanhar por manifestar livremente as suas idéias.

Muitas das pessoas que estiveram no protesto da semana passada e estarão no de hoje em São Paulo não fumam maconha, bebem cerveja, tomam uísque, usam tabaco, ou seja, não consomem nenhum entorpecente. Mas vão às ruas pelo direito a ter direito à palavra. Tripudiam o “não é comigo, então que se danem os outros”, porque sabem que quando chegar o amanhã e vierem bater à sua porta pode não haver mais ninguém para ajudar.

Ou, lembrando John Donne, poeta inglês, citado em “Por Quem os Sinos Dobram”, de Ernest Hemingway, ao defender que a fatalidade sobre qualquer ser humano me diminui, pois sou parte da humanidade: nunca procure saber por quem os sinos dobram, pois eles dobram por ti. Temos uma boa Constituição Federal, que defende as liberdades individuais, mas não conseguimos colocá-la em prática. Isso vale uma reflexão. Afinal de contas, a culpa por esse fracasso é sempre dos outros? Ou ficamos também nós em pedestais de mármore lutando pelo nosso quinhão de direitos enquanto o meu vizinho se estrepa?

Por fim, um comentário. Se a decisão tivesse saído de qualquer outra corte brasileira, talvez me espantasse. Mas como veio das togas do Estado de São Paulo, fico mais tranqüilo. Faz sentido.
Maria Aparecida foi mandada para a cadeia por ter furtado um xampu e um condicionador. Perdeu um olho enquanto estava presa. Sueli também foi condenada pelo roubo de dois pacotes de bolacha e um queijo minas. São dois, mas poderia ter dado muitos outros exemplos que ocorreram em São Paulo, Estado que julga com celeridade casos de reintegração de posse contra sem-terra e sem-teto, mas é moroso nos casos de desapropriação de terras griladas que deveriam retornar ao poder público. Implacável quando o furto é pequeno, preguiçoso quando o furto é grande.

Não creio que manter alguém na cadeia por conta de um xampu vai ajudar em sua reinserção social. Da mesma forma, não é possível em sã consciência acreditar que proibir o debate sobre as drogas irá impedir que elas sejam usadas. Mas preferimos o porrete ao diálogo.

E normalmente a sanha punitiva tem alvo certo por aqui: a massa de sem-advogado, rotos e pobres, que ousam ir contra alguma coisa. Havia muita gente de classe média respirando gás lacrimogênio na semana passada, mas também muitos da periferia. Sem medo de ser leviano, creio que o fato do protesto ser menos branco e mais pardo facilita um pouco para a Justiça e a polícia. Afinal de contas, se a manifestação fosse em um bairro nobre, juntando o pessoal criado no leite Ninho, teria o Estado se sentido tão à vontade para descer o cacete?

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Super pop, Folha Teen, Record e o circo homofóbico travestido de liberdade de expressão

Mais um artigo da Maria Frô que não poderia deixar de publicar. Texto incisivo, direto, cuja linha argumentativa coincide com tudo o que acredito e defendo.

Por Maria Frô:


Ontem assisti a um verdadeiro show de horror no programa Super Pop, uma caricatura de debate sobre homofobia. Entre os convidados, Bolsonaro, Agnaldo Timóteo, um ‘ex-gay’ pastor e a travesti Luiza Marilac. O ‘debate’ virou um circo com direito do defensor dos homossexuais dizer que é contra a parada gay e um casal de lésbicas ser convidado para o programa e, ao final, Luciana Gimenez jogar para platéia a decisão de um beijo entre as mulheres.
Pouco ou quase nada se discutiu em relação ao PLC122, à violência contra a comunidade LGBT provocada pela crescente homofobia e estimulada pelo debate caricato das tevês abertas.
Um pouco mais cedo, o Jornal da Record fez possivelmente a abordagem mais preconceituosa e tendenciosa contra os materiais pedagógicos anti-homofobia. Não havia um pingo de jornalismo na matéria.
É assustador como as tevês comerciais (concessões públicas) dão voz crescente à homofobia e aos homofóbicos, aos fundamentalistas, aos conservadores, aos preconceituosos que acham que vivemos num Estado Teocrático e absolutamente nada aconteçam com elas. Marco regulatório, já!
Ontem também li uma entrevista com Bolsonaro na Folha Teen, incrível como alguém que se arroga ‘defensor da família’ possa ter um vocabulário tão chulo.
Lembrando que este Caderno da Folha é destinado aos adolescentes é no mínimo contraditório ver a grande mídia condenar um material pedagógico cuidadoso que objetiva criar uma cultura de paz e anti-homofóbica, dar amplo espaço para um deputado que se refere às mulheres, aos negros e aos homossexuais de maneira tão desrespeitosa.
A começar pelo título da matéria: ’Salvei o Negão Celso, boiola, da morte’, lembra Bolsonaro. Além de ‘boiola’, Bolsonaro’ usa ‘viadinho’ para definir os homossexuais: “Agora vocês falam de homofobia. Naquele tempo, era viadinho mesmo.”
Quando o assunto são as namoradas da época de adolescência do deputado que estimula a homofobia, o tratamento desrespeitoso prossegue: “Quando aparecia uma menina, era igual cadela no cio, aquele bando de cachorro atrás.” Ou ainda: “A grande preocupação era gonorreia, mas, se você pegava, era marcado pela galera como “machão”, “garanhão”. Ao se referir à própria mãe ele diz: “Minha mãe, basicamente, era aquela chocadeira: um filho atrás do outro.”
Bolsonaro também defende a tortura praticada pelo Estado durante a Ditadura como ‘regra do jogo’: “Teve gente torturada, sim. Nós não negamos. Você só pode obter informações dessa maneira, é a regra do jogo.”
Como educadora luto para uma escola que respeite as diferenças, uma escola sem homofobia, racismo, sexismo ou qualquer outra expressão de preconceito, discriminação e violência. Como cidadã, vivendo em um Estado democrático não é possível acharmos que faz parte da ‘liberdade de expressão’ a defesa à tortura e o tratamento desrespeitoso dispensado às mulheres, homossexuais e negros como os expressos por Bolsonaro e seus adeptos.
Em um regime democrático no qual vigoram leis cidadãs, discursos homofóbicos, racistas, sexistas não podem ser tratados e aceitos como “opinião”, eles são demonstrações claras de preconceito e estimulam a violência.
Nossa sociedade precisa se preocupar mais com esta cultura da violência disseminada pela grande mídia que dá voz e vez a esses políticos caricatos e quase nunca espaço para um debate sério e responsável que possa contra argumentar contra esta cultura do ódio e pela defesa das verdadeiras liberdades democráticas e garantia dos direitos humanos.
Se tratamos com o descaso que estamos tratando esta questão séria o ovo da serpente do autoritarismo, do fascismo vai sendo chocado a olhos vistos e resulta em pura expressão de ódio que já podemos ver em vários espaços sociais.
Fiquem com um estudo da Safernet que evidência com muita clareza o resultado da expressão do ódio vendido pela grande mídia irresponsável como ‘liberdade de expressão’.
SaferNet: Bolsonaro agravou violência de ataques no Twitter
Por: Ana Cláudia Barros, no Terra Magazine
18/05/2011
A máxima “a internet é um espelho fiel da sociedade” parece ainda mais cabível quando observadas as ondas de discriminação e ódio que têm emergido nos últimos meses no Twitter. Análise da evolução diária das denúncias no microblog, elaborada pela SaferNet e obtida com exclusividade por Terra Magazine, confirma o que já se suspeitava: eventos do “mundo real” impactam diretamente o ambiente virtual.
Nas cinco principais ondas de ataques e nas manifestações de menor proporção deflagradas no Twitter, no período que vai de novembro de 2010 a 16 maio deste ano, essa correlação fica evidente, conforme enfatiza o presidente da SaferNet Brasil – organização não-governamental que combate crimes contra direitos humanos na rede -, Thiago Tavares.
Ele chama a atenção para o “aumento significativo” da frequência e da violência dos ataques após a entrada em cena do deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ).
- Com suas declarações polêmicas, o Bolsonaro acendeu o pavio e encorajou algumas ondas sucessivas de homofobia no Twitter e nas outras redes sociais no Brasil; Orkut principalmente – afirma, destacando a conexão entre realidade “online” e “offline”.
- Se forem cruzados os dados da planilha com as notícias veiculadas na imprensa, é possível perceber ligação com fatos, como disputas no Congresso, violência a homossexuais na Avenida Paulista, chuvas no Nordeste, metrô em Higienópolis.
Sobre as ondas menores, acrescenta:
- Elas têm se apresentado constantes ao longo de 2011. Em sua maioria, foram detonadas pela polarização do debate em torno dos direitos dos homossexuais.
De acordo com Tavares, a incidência das manifestações de discriminação começou a se acirrar a partir do final do segundo semestre de 2010. Sobre os motivos deste crescimento, argumenta:
- Dois fatores são importantes e, em conjunto, ajudam a entender esses números. O Twitter se expandiu muito no Brasil do segundo semestre pra cá. Hoje, tem em torno de 15 milhões de usuários (no mundo, são cerca de 180 milhões). O aumento expressivo na base de usuários também influenciou no número de casos – diz, prosseguindo com a explicação:
- Outro fator importante foi a violência no debate eleitoral. Essa agressividade que permeou a campanha dos candidatos foi transposta para os eleitores. O clima de animosidade criou um ambiente propício para essas manifestações exacerbadas de ódio.
Evolução das denúncias de manifestações de ódio no Twitter em 2010(Fonte:SaferNet)

Evolução das denúncias de manifestações de ódio no Twitter em 2011 (Fonte:SaferNet)
De janeiro a dezembro de 2010, 2.372 tweets(mensagens postadas no microblog) com teor discriminatório foram encaminhados à Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos, criada pela SaferNet e operada em parceria com os ministérios públicos federal e estaduais e a Polícia Federal.
Ao todo, foram contabilizados 23.589 denunciantes. Só de janeiro a 16 de maio de 2011, 1.181 tweets com as mesmas características foram reportados à SaferNet, quase a metade do acumulado no ano passado inteiro. Até a mencionada data, 8.942 pessoas se dispuseram a delatar os casos de discriminação. Todas as denúncias são anônimas.
“Detonadores”
O presidente da SaferNet explica que as ondas de preconceito no Twitter Brasil são desencadeadas pelo que chama de “perfis detonadores”, usuários que “assumem a dianteira e inauguram uma sequência de ódio, uma gritaria generalizada”.
A primeira grande onda aconteceu entre 1º e 4 de novembro do ano passado, logo após o anúncio do resultado das eleições presidenciais. Conforme a SaferNet, o perfil da estudante de Direito Mayara Petruso, apontada na época como pivô da polêmica em razão do comentário de que queria afogar os nordestinos, foi, de fato, o estopim das manifestações de preconceito. Neste período de quatro dias, 4.002 pessoas acionaram a ONG para denunciar.
Tavares comenta que foi necessário um “tratamento de choque” para estancar o tumulto na rede.
- Preparamos um relatório com 1.037 contas do Twitter, mandamos a lista para o Ministério Público e comunicamos à imprensa. Foi imediato. Cessou rapidamente.
- Se você comparar essa onda com as demais, vai perceber que as outras ondas duram, no máximo, 48, 72 horas estourando. A onda contra os nordestinos após as eleições, por sua vez, iria perdurar por mais de uma semana. Ela já durava cinco dias. Era uma atividade enorme. As mensagens estavam cada vez mais agressivas. Isso nos surpreendeu. Era uma onda absolutamente sem controle. Por isso decidimos adotar uma ação enérgica.
O segundo “tsunami” virtual foi registrado entre 17 e 19 do mesmo mês, após o lançamento, às vésperas do Dia Nacional da Consciência Negra, da campanha no Twitter “#HomofobiaNão”. Em contraposição ao movimento, grupos conservadores criaram o perfil e a hashtag “#HomofobiaSim”, o que impulsionou uma sequência de manifestações de repúdio aos homossexuais. Ao todo, 8.574 denunciaram.
Já a terceira onda, observada entre 29 e 30 também de novembro, teve como mote o neonazismo. Os alvos? Negros e gays. Os dois perfis apontados como os responsáveis pela propagação do ódio (@anjooslava e @anjonazistaheil) já não estão mais ativos, mas os comentários racistas e homofóbicos podem ser vistos via buscador Topsy, que mostra quem foram os autores da divulgação de determinado tweet e exibe as mensagens mais repassadas pelos usuários.
Entre os recados deixados pelos perfis, ataques frontais como: “Eu odeio homossexuais, desejo que todos eles tenham uma morte sofrida e dolorosa, meu sonho é um dia ver a humanidade livre dessa raça!”; “Meu avô foi brutalmente assassinado por um negro. Como eu vou defender esses lixos?”; “Rejeite o lixo multicultural! Despreze a escória homossexual!!! Não irei me acovardar, e sim massacrar”; “Esse país é um lixo, eles querem te obrigar a amar negros, homossexuais. Se for pra viver nesse lixo a minha vida toda, prefiro a morte”.
A quarta grande onda, ocorrida em 28 e 29 de dezembro, também foi alavancada pela aversão aos gays, lésbicas, transexuais e bissexuais. Segundo a SaferNet, os perfis detonadores foram @contraGays e @estuproSim, este último cancelado.
A série de ataques mais recente aconteceu em 12 deste mês, após a eliminação do Flamengo na Copa do Brasil pelo Ceará. Em um único dia, 5.150 internautas, indignados com o teor das mensagens de preconceito contra nordestinos, recorreram à SaferNet.

Matéria do Jornal da Record sobre material pedagógico anti-homofobia e o anti-jornalismo

Reproduzo artigo do blog da Maria Frô a respeito da "reporcagem" do Jornal da Record de ontem, a respeito do kit anti-homofobia . Lamentável o nível a que a rede record submete seus funcionários. Isso porque a mim parece ser a única explicação plausível para todas as reportagens acerca do tema terem um discurso único. Só pode ser uma linha editorial imposta pela cúpula religiosa da emissora.


Curioso que ao menos no R7 evitaram usar a famigerada expressão ‘kit gay’ repetida a exaustão ontem na matéria que foi ao ar no JR, nascida da bancada contra a garantia dos direitos civis à comunidade LGBT, à criminalização da homofobia e a ações voltadas pra combater a cultura de ódio contra homossexuais nas escolas.
Eu assisto o Jornal da Record, tem jornalistas de alto gabarito que já passaram por todas as emissoras de tevê e que fazem reportagens de qualidade.
Mas fazia tempo que eu não via um desserviço tão grande prestado às comunicações. Os termos adotados pelos âncoras, pela repórter que supostamente foi encontrar os educadores que produziram o material pedagógico para uma educação anti-homofóbica(‘homossexualismo’, ‘kit gay’); a forma como aparece a fala de Haddad, ministro da Educação, com uso de cenas de arquivos sem a sua voz e a reprodução de um trecho de sua fala durante o programa Bom dia Ministro,apresentada de modo semelhante à estratégia de gravações de denúncias de corrupção ou de crimes nos quais telefones dos envolvidos são grampeados (com arte gráfica que mostra o áudio com legendas) e, finalmente, nenhuma voz dissonante ao discurso fundamentalista dos entrevistados e largamente endossado com adjetivos superlativos reverberados pela ‘reporcagem’,nenhum dos 175 deputados da frente parlamentar que apóiam a aprovação do PLC122 foram ouvidos.
Ontem, indubitavelmente e infelizmente o Jornal da Record que, no conjunto vem fazendo um jornalismo de qualidade, manchou sua história com essa matéria preconceituosa e tendenciosa que apresentou, querendo provar a fórceps que a sociedade brasileira é tão homofóbica, fundamentalista, moralista e conservadora como as dos entrevistados cuidadosamente escolhidos e as falas dos jornalistas que se prestaram a esse papel.
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quarta-feira, 18 de maio de 2011

A trincheira de Jean Willys



Volto a postar depois de tanto tempo, depois de ver um comentário no Facebook sobre o tema, em que um evangélico diz que "a população brasileira vai sofrer na mão de Deus a partir da aprovação dessa lei, porque Deus não aprova isso, e todas as populações que infrigiram a lei de Deus, pagaram caro...". Então posto aqui um artigo de Leandro Fortes sobre a árdua batalha do Deputado Jean Willys contra a homofobia e o fundamentalismo religioso. Belíssimo texto:


Jean Wyllys de Matos Santos é um sujeito tranquilo, bem humorado, que defende idéias sem alterar a voz, as mais complexas, as mais simples, baiano, enfim. Ri, como todos os baianos, da pecha da preguiça, como assim nomeiam os sulistas um sentimento que lhes é desconhecido: a ausência de angústia. Homossexual assumido, Jean cerra fileiras no pequeno e combativo PSOL, a única trincheira radical efetivamente ativa na política brasileira. E é justamente no Congresso Nacional que o deputado Jean Wyllys, eleito pelos cidadãos fluminenses, tem se movimentado numa briga dura de direitos civis, a luta contra a homofobia.
Cerca de 200 homossexuais são assassinados no Brasil, anualmente, exclusivamente por serem gays. Entre eles, muitos adolescentes.
Mas o Brasil tem pavor de discutir esse assunto, inclusive no Congresso, onde o discurso machista une sindicalistas a ruralistas, em maior ou menor grau, mas, sobretudo, tem como aliado as bancadas religiosas, unidas em uma cruzada evangélica. Os neopentecostais, como se sabe, acreditam na cura da homossexualidade, uma espécie de praga do demônio capaz de ser extirpada como a um tumor maligno. O mais incrível, no entanto, não é o medievalismo dessa posição, mas o fato de ela conseguir interditar no Parlamento não só a discussão sobre a criminalização da homofobia, mas também o direito ao aborto e a legalização das drogas. Em nome de uma religiosidade tacanha, condenam à morte milhares de brasileiros pobres e, de quebra, mobilizam em torno de si e de suas lideranças o que há de mais lamentável no esgoto da política nacional.
Jean Wyllys se nega a ser refém dessa gente e, por isso mesmo, é odiado por ela. Contra ele, costumam lembrar-lhe a participação no Big Brother Brasil, o inefável programa de massa da TV Globo, onde a debilidade humana, sobretudo a de caráter intelectual, é vendida como entretenimento. Jean venceu uma das edições do BBB, onde foi aceito por ser um homossexual discreto, credenciado, portanto, para plantar a polêmica, mas não de forma a torná-la um escândalo. Dono de um discurso político bem articulado, militante da causa gay e intelectualmente superior a seus pares, não só venceu o programa como ganhou visibilidade nacional. De repórter da Tribuna da Bahia, em Salvador, virou redator do programa Mais Você, de Ana Maria Braga, mas logo percebeu que isso não era, exatamente, uma elevação de status profissional.
Na Câmara dos Deputados, Jean Wyllys, 36 anos, baiano de Alagoinhas, tornou-se a cara da luta contra a homofobia no Brasil, justamente num momento em que se discute até a criminalização do bullying. Como se, nas escolas brasileiras, não fossem os jovens homossexuais o alvo principal das piores e mais violentas “brincadeiras” perpetradas por aprendizes de brucutus alegremente estimulados pelo senso comum. Esses mesmos brucutus que, hoje, ligam para o gabinete do deputado do PSOL para ameaçá-lo de morte.
Abaixo, a íntegra de uma carta escrita por Jean ao Jornal do Brasil, por quem foi acusado, por um colunista do JB Wiki (seja lá o que isso signifique), de “censurar cristãos”. O texto é uma pequena aula de civilidade e História. Vale à pena lê-lo:
Em primeiro lugar, quero lembrar que nós vivemos em um Estado Democrático de Direito e laico. Para quem não sabe o que isso quer dizer, “Estado laico”, esclareço: O Estado, além de separado da Igreja (de qualquer igreja), não tem paixão religiosa, não se pauta nem deve se pautar por dogmas religiosos nem por interpretações fundamentalistas de textos religiosos (quaisquer textos religiosos). Num Estado Laico e Democrático de Direito, a lei maior é a Constituição Federal (e não a Bíblia, ou o Corão, ou a Torá).
Logo, eu, como representante eleito deste Estado Laico e Democrático de Direito, não me pauto pelo que diz A Carta de Paulo aos Romanos, mas sim pela Carta Magna, ou seja, pelo que está na Constituição Federal. E esta deixa claro, já no Artigo 1º, que um dos fundamentos da República Federativa do Brasil é a dignidade da pessoa humana e em seu artigo 3º coloca como objetivos fundamentais a construção de uma sociedade livre, justa e solidária e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. A república Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos princípios da prevalência dos Direitos Humanos e repúdio ao terrorismo e ao racismo.
Sendo a defesa da Dignidade Humana um princípio soberano da Constituição Federal e norte de todo ordenamento jurídico Brasileiro, ela deve ser tutelada pelo Estado e servir de limite à liberdade de expressão. Ou seja, o limite da liberdade de expressão de quem quer que seja é a dignidade da pessoa humana do outro. O que fanáticos e fundamentalistas religiosos mais têm feito nos últimos anos é violar a dignidade humana de homossexuais.
Seus discursos de ódio têm servido de pano de fundo para brutais assassinatos de homossexuais, numa proporção assustadora de 200 por ano, segundo dados levantados pelo Grupo Gay da Bahia e da Anistia Internacional. Incitar o ódio contra os homossexuais faz, do incitador, um cúmplice dos brutais assassinatos de gays e lésbicas, como o que ocorreu recentemente em Goiânia, em que a adolescente Adriele Camacho de Almeida, 16 anos, que, segundo a mídia, foi brutalmente assassinada por parentes de sua namorada pelo fato de ser lésbica. Ou como o que ocorreu no Rio de Janeiro, em que o adolescente Alexandre Ivo, que foi enforcado, torturado e morto aos 14 anos por ser afeminado.
O PLC 122 , apesar de toda campanha para deturpá-lo junto à opinião pública, é um projeto que busca assegurar para os homossexuais os direitos à dignidade humana e à vida. O PLC 122 não atenta contra a liberdade de expressão de quem quer que seja, apenas assegura a dignidade da pessoa humana de homossexuais, o que necessariamente põe limite aos abusos de liberdade de expressão que fanáticos e fundamentalistas vêm praticando em sua cruzada contra LGBTs.
Assim como o trecho da Carta de Paulo aos Romanos que diz que o “homossexualismo é uma aberração” [sic] são os trechos da Bíblia em apologia à escravidão e à venda de pessoas (Levítico 25:44-46 – “E, quanto a teu escravo ou a tua escrava que tiveres, serão das gentes que estão ao redor de vós; deles comprareis escravos e escravas…”), e apedrejamento de mulheres adúlteras (Levítico 20:27 – “O homem ou mulher que consultar os mortos ou for feiticeiro, certamente será morto. Serão apedrejados, e o seu sangue será sobre eles…”) e violência em geral (Deuteronômio 20:13:14 – “E o SENHOR, teu Deus, a dará na tua mão; e todo varão que houver nela passarás ao fio da espada, salvo as mulheres, e as crianças, e os animais; e tudo o que houver na cidade, todo o seu despojo, tomarás para ti; e comerás o despojo dos teus inimigos, que te deu o SENHOR, teu Deus…”).
A leitura da Bíblia deve ensejar uma religiosidade sadia e tolerante, livre de fundamentalismos. Ou seja, se não pratica a escravidão e o assassinato de adúlteras como recomenda a Bíblia, então não tem por que perseguir e ofender os homossexuais só por que há nela um trecho que os fundamentalistas interpretam como aval para sua homofobia odiosa.
Não declarei guerra aos cristãos. Declarei meu amor à vida dos injustiçados e oprimidos e ao outro. Se essa postura é interpretada como declaração de guerra aos cristãos, eu já não sei mais o que é o cristianismo. O cristianismo no qual fui formado – e do qual minha mãe, irmãos e muitos amigos fazem parte – valoriza a vida humana, prega o respeito aos diferentes e se dedica à proteção dos fracos e oprimidos. “Eu vim para que TODOS tenham vida; que TODOS tenham vida plenamente”, disse Jesus de Nazaré.
Não, eu não persigo cristãos. Essa é a injúria mais odiosa que se pode fazer em relação à minha atuação parlamentar. Mas os fundamentalistas e fanáticos cristãos vêm perseguindo sistematicamente os adeptos da Umbanda e do Candomblé, inclusive com invasões de terreiros e violências físicas contra lalorixás e babalorixás como denunciaram várias matérias de jornais: é o caso do ataque, por quatro integrantes de uma igreja evangélica, a um centro de Umbanda no Catete, no Rio de Janeiro; ou o de Bernadete Souza Ferreira dos Santos, Ialorixá e líder comunitária, que foi alvo de tortura, em Ilhéus, ao ser arrastada pelo cabelo e colocada em cima de um formigueiro por policiais evangélicos que pretendiam “exorcizá-la” do “demônio”.
O que se tem a dizer? Ou será que a liberdade de crença é um direito só dos cristãos?
Talvez não se saiba, mas quem garantiu, na Constituição Federal, o direito à liberdade de crença foi um ateu Obá de Xangô do Ilê Axé Opô Aforjá, Jorge Amado. Entretanto, fundamentalistas cristãos querem fazer uso dessa liberdade para perseguir religiões minoritárias e ateus.
Repito: eu não declarei guerra aos cristãos. Coloco-me contra o fanatismo e o fundamentalismo religioso – fanatismo que está presente inclusive na carta deixada pelo assassino das 13 crianças em Realengo, no Rio de Janeiro.
Reitero que não vou deixar que inimigos do Estado Democrático de Direito tente destruir minha imagem com injúrias como as que fazem parte da matéria enviada para o Jornal do Brasil. Trata-se de uma ação orquestrada para me impedir de contribuir para uma sociedade justa e solidária. Reitero que injúria e difamação são crimes previstos no Código Penal. Eu declaro amor à vida, ao bem de todos sem preconceito de cor, raça, sexo, idade e quaisquer outras formas de preconceito. Essa é a minha missão.

Jean Wyllys (Deputado Federal pelo PSOL Rio de Janeiro)

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Publicidade israelense




Uma agencia de publicidade israelense fazendo propaganda de um carro que atropelou duas crianças palestinas.

O texto em hebraico diz:vamos ver quem pode nos enfrentar.

O atropelador foi um colono judeu que sequer prestou socorro às vitimas.

Sinceramente, se os publicitários israelenses entendem que esse tipo de anuncio vende, o que esperar do restante da sociedade judaica?

É triste, muito triste...

Abaixo você assiste ao atropelamento que gerou o anúncio

Fonte: Blog do Boudokan

PS: Ainda tem alguns religiosos que colocam um adesivo com os dizeres "Eu amo Israel" em seus veículos... É lamentáel...

Mídia e a lógica implacável da mercadoria

Artigo de Venício A. de Lima, publicado no Observatório da Imprensa:



Não há qualquer novidade, mas o registro em certas ocasiões – quase um desabafo indignado – se torna obrigatório: a lógica dentro da qual opera a mídia comercial coloca seus interesses empresariais acima de literalmente tudo, ignorando os valores fundamentais da convivência humana em busca de suas metas de lucro.

Não é necessário refazer análises sobre a comprovada relação entre o entretenimento violento, as coberturas jornalísticas da violência e o aumento da própria violência na sociedade (ver, por exemplo, neste Observatório, "A violência urbana e os donos da mídia" e "A mídia e a banalização da violência").



Alguns fatos recentes apenas comprovam o que já se sabe. Confirma-se a hipocrisia ilimitada da grande mídia comercial que, apesar de conhecer perfeitamente as consequências de seus atos, finge não ter nada a ver com o que acontece. Afinal, o Ibope confirma que os índices de audiência das redes Globo e Record cresceram significativamente com a cobertura da tragédia em Realengo.

A lógica do esporte na TV

Há, todavia, um outro lado da lógica do entretenimento associado às transmissões esportivas que nem sempre transparece para o grande público.

Depois do acidente de ônibus com a delegação do Vôlei Futuro, que seguia para o primeiro jogo da fase semifinal da Superliga Feminina contra o Sollys/Osasco, na terça-feira (12/4), iniciou-se uma imensa pressão da TV Globo e da Confederação Brasileira de Vôlei para o cumprimento do calendário e a realização das partidas.

O Twitter de uma das jogadoras foi reproduzido em post no blog do comentarista Bruno Voloch, na quinta-feira (14), e revela a verdadeira dimensão da perversidade desumanizada que opera nessas circunstâncias. Transcrevo:

"Indignada com a CBV, Joycinha desabafa: ‘A TV está pressionando, mas somos seres humanos’

"A pressão da TV Globo e da CBV pela realização da primeira partida semifinal entre Osasco e Vôlei Futuro até o próximo dia 19, deixou revoltada a oposta Joycinha do time de Araçatuba.

"Através do Twitter, a jogadora reclamou e se mostrou indignada:

"‘Nesse momento não tem que pensar em televisão. A televisão está pressionando, mas tem que lembrar que somos seres humanos’.

"Joycinha não economizou críticas aos responsáveis pela superliga:

"‘Psicologicamente estamos muito abaladas. Fisicamente, também não estamos legal. Estamos bem, mas para jogar vôlei, cair na quadra e saltar, não. É preciso ter o mínimo de bom senso’.

"Joycinha está com vários hematomas no rosto e com dores no pescoço.

"Conforme o blog informou, a CBV colocou à disposição do Vôlei Futuro as datas entre 15 e 19 de abril para a realização da primeira partida. A TV Globo não admite a idéia de fazer a decisão da superliga em maio e a data para a decisão está marcada para 30 de abril no Mineirinho em Belo Horizonte."


O que se pode fazer?

A saída para escapar à lógica comercial prevalente na grande mídia é o fortalecimento do sistema público que, pelo menos em tese, coloca o interesse público em primeiro lugar.

Quem sabe, viveremos para ver um marco regulatório que coloque efetivamente em funcionamento o princípio da complementaridade entre os sistemas público, privado e estatal de radiodifusão que adormece há mais de 22 anos no artigo 223 da Constituição?

A ver.

sábado, 16 de abril de 2011

Para O Globo, pobre (ainda mais do MST) merece menos que cavalo




É simplesmente nojenta a matéria de capa e manchete da página 10 de hoje de O Globo.
Faz um escândalo  com o fato de o Governo da Bahia (leia-se Jacques Wagner) mandar dar comida aos mais de três mil pobres do MST que, pedindo um pedacinho de terra, ocuparam pacificamente a Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária do Estado.
Comida, arroz, feijão e  o pior,  carne. Menos de 200 gramas por dia para cada pessoa, mas é um absurdo!
E banheiros químicos, vejam que despautério, para que eles façam suas necessidades.
Ah, e chuveiros e água, para tomarem banho.
É, como diz o jornal, “uma colônia de férias”. Vocêr pode ver na foto uma atividade de lazer: fazer carne de sol, para guardar um pouco para ter o que comer amanhã, que luxo!
A matéria é tão abjeta que nem mesmo encarregaram um repórter do jornal de fazê-la. Encomendaram-na de um graduado do jornal A Tarde, de Salvador, conhecido pelas ligações que diz não ter com o carlismo.
Carne para os sem-terra comerem, que escândalo. Um abuso, uma fartura, um exagero. Ora, nem os cavalos do Haras da família Marinho “comem carne, onde já se viu! Segundo a Folha, só ração e feno trazido do sul, além de linhaça. “Sem frescura”, diz o jornal. Tomam banho com xampú neutro, enquanto os sem-terra esbanjam com sabão de côco.
Os cavalos do Haras Marinho só custam, além disso, mais R$ 3.600 por mês ou mais R$ 1.000, quando vão para um SPA. Preços de 2009, está na Folha.
Ah, a elite brasileira e sua mídia “Maria Antonieta”…Acho que a opção “www.brioches.com” aí da pesquisa sobre o nome do site de Figueiredo Henrique Cardoso vai ganhar uns votinhos…

Fonte: Tijolaço.com

O sonhado relatório para a Fifa


Por RAFA KLEIN*


Tive um sonho esquisito.
Sonhei que o Joseph Blatter me ligava para falar da Copa de 2014 (eu preferia que fosse a Gisele Büdchen, mas fazer o quê, não dá para manda nos sonhos da gente).
Ele me cobrava uma resposta final sobre estádios e projetos de melhorias das cidades-sede.
Sem saber o que falar, argumentei que faltavam ainda três anos para 2014, que temos muito tempo, e todas essas coisas que diz quem está atrasado nas suas obrigações.
Ele respondeu aos berros: “2014 é amanhã. E vocês, brasileiros, deixam tudo para depois de amanhã.”
Diante da bronca, fiz um relatório tentando mostrar ao Zé Blatter que está tudo bem e que a Copa aqui vai ser um sucesso:
Expliquei que o Rio está bem avançado, com 3 estádios prontos: o Engenhão, o de Volta Redonda e o de Macaé.
Como o Engenhão não caiu nas graças do torcedor, eu sugeri fazer a abertura em Macaé, evitando a Linha Vermelha, que é tranquila, mas sofre eventualmente de congestionamento de arrastões.
O problema da mobilidade urbana de São Paulo já estaria resolvido, porque em 2014 todos andarão a pé, queiram ou não.
Estádio também não é problema.
O Fielzão já está pronto no computador e, ainda assim, argumentei que se os jogos forem realizados no terreno como está, vai caber muito mais gente do que em no estádio depois de construído.
Uma inovação que só uma Copa no Brasil poderia trazer.
No Rio Grande do Sul, tem o estádio do Inter em fase avançada de reformas, mas como não gostamos de nada fácil, devemos realizar os jogos no ainda não existente estádio do Grêmio.
O Rio Grande do Norte tem problemas, é verdade, mas temos um plano B que é usar o estádio do Inter como base.
A distância não será problema, é tudo Rio Grande mesmo.
Em Salvador tem o maior metrô do mundo, tanto que levou mais de 20 anos para ficar pronto desde que começou a ser construído.
E, convenhamos, o que é que tem funcionar apenas 4 km durante a Copa se ele é o maior do mundo?
E disse mais.
Que o estádio de Recife não vai ter dono, mas vai ser absolutamente viável.
Que em Brasília o estádio é adequado, sim, aos tamanhos dos times locais que são Flamengo, Vasco, Fluminense e Botafogo.
E que 30% dos aeroportos utilizados na Copa estarão operando dentro da capacidade, o que é um crescimento de 30% em relação ao que a gente tem hoje.
Enfim, não temos com o que nos preocupar.
Depois da explicação ele desligou o telefone berrando de felicidade.
Acordei e agradeci por não ter que falar com o Blatter novamente ao telefone.
Ele grita muito. Horas depois, li nos jornais que ele andou a elogiar a preparação do Brasil para a Copa de 2014.
De duas, uma: ou tudo era verdade e eu mandei muito bem nas minhas explicações, ou ainda estou sonhando.

*Rafael Klein Pedroso é publicitário.


Fonte: Blog do Juca

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Mal-agradecida, Folha ataca novela do SBT

A Folha de São Paulo ficou enfurecida com o relato real de torturado que a novela Amor e Revolução levou ao ar ao fim do seu capítulo da última quinta-feira. Foi por isso que o jornal pôs, neste domingo, seu colunista-bombril, Fernando de Barros e Silva, para atacar a produção do SBT.
O relato que enfureceu o jornal paulista foi o de Rose Nogueira, que, sorvendo uma doce vingança, citou a Folha da Tarde ao descrever as sevícias que sofreu nas mãos da ditadura. Quem é Rose Nogueira? Ah, ela tem uma história com o Grupo Folha…
Antes de tratar do disparo que a Folha fez no que viu e que errou, porque pegou no que não viu, relembremos quem é Rose. Ela foi presa em São Paulo em 1969 e solta em 1970. Era jornalista da Folha da Tarde – jornal antecessor da Folha de São Paulo, também de propriedade da família Frias – e foi militante da Ação Libertadora Nacional (ALN).
Antes de prosseguir, peço que o leitor assista, abaixo, ao depoimento que Rose deu ao SBT para ser exibido em sua novela. Atente para o fato de que ela põe ênfase no nome da Folha da Tarde, citando-a duas vezes. Em seguida, continuo.
Se o prezado leitor já se recuperou do choque que relato tão duro causa, vejamos por que Rose cita a Folha. E será melhor usar as próprias palavras da depoente para explicar o que tem o seu antigo empregador que ver com o que ela passou na ditadura:
Ao buscar, agora, nos arquivos da Folha de S. Paulo a minha ficha funcional, descubro que, em 9 de dezembro de 1969, quando estava presa no DEOPS, incomunicável, “abandonei” meu emprego de repórter do jornal. Escrito à mão, no alto: ABANDONO. E uma observação oficial: Dispensada de acordo com o artigo 482 – letra ‘i’ da CLT – abandono de emprego”.
Por que essa data, 9 de dezembro? Ela coincide exatamente com esse período mais negro, já que eles me “esqueceram” por um mês na cela.
Como é que eu poderia abandonar o emprego, mesmo que quisesse? Todos sabiam que eu estava lá, a alguns quarteirões, no prédio vermelho da praça General Osório. Isso era e continua sendo ilegal em relação às leis trabalhistas e a qualquer outra lei, mesmo na ditadura dos decretos secretos. Além do mais, nesse período, caso estivesse trabalhando, eu estaria em licença-maternidade.
Não sabíamos disso. Nem eu nem Cláudio Abramo, que tentou interferir para me reconduzir ao trabalho na saída da prisão, sem sucesso. Imagino que ninguém da empresa, atualmente, deva saber ou se interessar por esse assunto. A culpa não é deles. Não sei se isso mudou a minha história, a minha vida. Estou viva.
Pois é… Duro, não?
Enfim, mas a questão é que a Folha não gostou. Apesar de, durante as comemorações dos seus 90 anos, o jornal da ditadura ter reconhecido a parte legal de sua atuação pró regime militar, há partes que os Frias não aceitam discutir porque depõem contra a memória do patriarca da família, hoje na terra dos pés juntos.
Vamos, pois, ao ataque do poodle mais feroz do Otavinho à novela do zangado Senor Abravanel, que não gostou nada, nada de a mídia tê-lo exposto no caso do Banco Panamericano com o Fundo Garantidor. E, em seguida, o que penso do que escreveu.
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FOLHA DE SÃO PAULO
10 de abril de 2011
Aposta do SBT não vale como ficção nem como documento
Enredo confunde dados históricos e direção remete a dramalhão mexicano


NA NOVELA COM INTENÇÕES EDIFICANTES, ADULAR A PRESIDENTE PARECE MAIS IMPORTANTE QUE ESCLARECER AS MASSAS


FERNANDO DE BARROS E SILVA
COLUNISTA DA FOLHA
Líder estudantil delicada e idealista, filha de pais comunistas, Maria Paixão (Graziela Schmitt) é a heroína da trama. Seu par romântico é José Guerra (Claudio Lins), jovem major fiel aos ideais democráticos, filho do general Lobo Guerra, da linha dura do Exército. “Maria” e “José”, “Paixão” e “Guerra” -isto é “Amor e Revolução”, novela sobre a luta armada que estreou na terça, no SBT.
Mais do que maniqueísta, tudo é muito primário. O principal vilão, supostamente inspirado na figura de Sérgio Paranhos Fleury, o chefe torturador do Dops (a polícia política da ditadura), se chama Delegado Aranha (Jayme Periard). Seu assistente no porão da tortura é o inspetor Fritz (Enando Tiago).
O assunto é sério, o SBT criou enorme expectativa em torno da novela, mas o resultado é uma piada.
As novelas da Globo, que nos servem de referência, também são ruins. Em “Passione”, para citar um exemplo recente, havia uma mixórdia de gêneros -o pastelão farsesco, a trama policialesca, o drama social, o folhetim romântico- convivendo num mesmo enredo, obviamente desprovido de qualquer unidade dramatúrgica.
Esse Frankenstein estilístico é uma aspiração deliberada da novela global, uma fórmula com que a emissora busca atender às demandas de um público heterogêneo, que ela trata de massificar diante da tela.
“Amor e Revolução” é ruim em outro sentido. O SBT quis fazer um banquete, mas não domina a receita do suflê. Tudo é tecnicamente precário, mas não exatamente “pobre”. Temos uma superprodução “trash” -ou, talvez, uma “supertrash” produção.
A direção de atores nos remete àqueles dramalhões mexicanos. Os diálogos são postiços, ginasianos e involuntariamente cômicos -uma mistura de CPC (os centros culturais do catecismo socialista dos anos 60) com “A Praça É Nossa”.
Eis um exemplo: um casal de guerrilheiros veteranos está num sítio idílico, à beira da cachoeira. Jandira (Lúcia Veríssimo) se vira para Batistelli (Licurgo Spinola) e pergunta: “Você me trouxe aqui para fazer amor ou fazer a revolução?”. E ele: “Os dois. O amor cria tudo, a revolução muda tudo”. Os dois então se amam nas águas, na mesma toada da novela “Pantanal”.
Não é só. Falta a “Amor e Revolução” aquele mínimo de verossimilhança que a ficção com pretensões históricas deveria ter. A novela começa com uma chacina de estudantes que articulavam a guerrilha numa chácara. Os assassinos são Lobo, Aranha e sua turma. Mas tudo isso se passa antes do golpe de 31 de março de 1964.
Não havia, então, guerrilha no Brasil. A tortura contra adversários da ditadura só seria adotada pelo regime de modo sistemático depois do AI-5, em 1968. “Amor e Revolução” mistura tudo no liquidificador. Não presta como obra de ficção nem tem valia como documento histórico.
Restam, além das cenas abundantes de tortura, os depoimentos de personagens reais ao final de cada capítulo, como costuma fazer Manuel Carlos. É bom que o povo que gosta do programa do Ratinho conheça os horrores de que foi capaz a ditadura.
Na novela com intenções edificantes do SBT, porém, adular a atual presidente parece mais importante do que esclarecer as massas.
NA TV 
Amor e Revolução
Novela de Tiago Santiago no SBT
QUANDO de seg. a sex., às 22h15
CLASSIFICAÇÃO 14 anos
AVALIAÇÃO ruim
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Há que rir, primeiro, é da “avaliação ruim” ao pé da matéria. Como se fosse possível que um jornal que ajudou a implantar a ditadura, e que foi seu instrumento, pudesse gostar de alguma maneira de uma novela denunciando essa mesma ditadura. Só podia avaliá-la como ruim, ora.
Barros e Silva, que em 1964 nem nascido era, confunde tudo. Acha que a extrema-direita só começou a atacar e torturar comunistas depois do AI-5. Por má fé ou ignorância, confunde a cena inicial da novela, em que um grupo de jovens se reúne em um sítio para sonhar com o socialismo, com a guerrilha de resistência à ditadura.
Dá vontade de rir quando o colunista chama de “maniqueísmo” mostrar o nível de criminalidade que envolvia os autores do golpe de 1964. Queria que o SBT apresentasse uma história em que os bandidos não fossem apresentados como tal, no mínimo.
E a parte da resenha que o totó do Otarinho faz sobre a novela que afirma que esta se destina a adular Dilma Rousseff, isso pertence à Coleção Folha de Fantasias, que tem “Best-Sellers” como Ficha Falsa da Dilma e Menino do MEP. Só esses palhaços acreditam – ou dizem que acreditam – que Dilma favoreceria Silvio Santos (de que maneira?) por conta de uma novela.
Todavia, a Folha atirou no que viu e acertou no que não viu. De fato há uma grave incongruência histórica na novela Amor e Revolução: a imprensa golpista, que teve papel crucial na instalação da ditadura e na tortura e assassinato de presos políticos, sumiu da trama.
Essa Folha… Quanta ingratidão. Deveria agradecer a Silvio Santos por esconder os crimes da imprensa golpista. Em vez disso, ataca o benfeitor com críticas que presumem que o leitor é tão idiota quanto o seu improvisado crítico-pistoleiro de plantão.

Fonte: Blog da Cidadania